Solidariedade com a moeda alheia (por Dr. André Luis Luengo)

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SOLIDARIEDADE COM A MOEDA ALHEIA 

“Pois eu tive fome, e vocês me deram de comer; tive sede, e vocês me deram de beber…”. (Mateus 25:35:)

Na época dos festejos natalinos é comum assistirmos por parte de alguns, que sob o pretenso manto da benevolência, procuram divulgar por meio da pirotécnica as suas ditas “ações solidárias”. Mas na dura realidade, ao olharmos pela lente refinada da finalidade, infelizmente é apenas e tão somente a divulgação da sua pequena e insignificante imagem pessoal.

Ter e praticar a empatia é indubitavelmente algo nobre do sentimento humano. Costumo dizer que ajudar é muito melhor do que ser ajudado.

Mas para entender, compreender e ajudar o próximo é imprescindível que a prática do ato seja com moralidade, isto é, com o sinônimo de uma verdadeira tarefa laborativa pela qual uma pessoa consiga transformar a vida de outra pessoa.

Senão vejamos.

No livro bíblico de Mateus 6 fala: “o que uma mão faz a outra não precisa saber”.

Em síntese, o que fazemos pelas outras pessoas não deveria ser colocado em um outdoor, ou o que vemos hoje, nas redes sociais, como um produto que se exibe numa “vitrine de boas ações”.

 A autopromoção é algo que desvia toda a finalidade daquilo que prega a solidariedade. Quando se age desta maneira, a ideia é apenas e tão somente “ganhar likes”, expor para os outros a sua “boa ação com a moeda alheia”.

A verdadeira empatia não pode estar travestida do leviano interesse de ganhar ou galgar admiração. O que fazemos para o outro é simplesmente para que, em foro íntimo, nos sintamos gratificados pela oportunidade de poder ajudar o próximo.

Mas essa ação deve ser ética no aspecto da probidade e da humanidade.

O que eu faço foi uma tarefa ética?

A resposta é simples. Consiste em entender que a tarefa é verdadeiramente minha e eu estou fazendo-a com o fruto dos meus recursos. Acaso eu pratique solidariedade com a moeda alheia, aí eu estou representando aquele que efetivamente pratica a boa ação. Sou um mandatário. Embora válido no contexto de quem recebe, perde legitimidade a pirotecnia que muita das vezes é somente isso que alguns estão preocupados em demonstrar. Um outro aspecto importante é também analisar se o alcance da minha tarefa contribuiu para que a vida de alguém se tornasse melhor de alguma maneira: necessidade de quem recebe.

O instituto que sustenta a ética está em saber valorizar as pessoas e contribuir para uma sociedade melhor, sem a sorrateira ideia da propaganda ou do seu marketing pessoal.

As boas ações devem ser feitas em segredo e nunca, jamais, se valer dos outros para a alardeada prática das mesmas. Isso é como fazer promessas em nome dos outros, ou seja, inadmissível.

O Cristão, independente da sua fé religiosa, mas como fiel, não pode prometer o que não consegue cumprir. Essa promessa não compreende apenas a ação futura, mas o hoje, o presente, o motivo moral da sua conduta solidária.

O significado de “pagar promessas”, compreende que quem a faz deve ter as condições físicas, psíquicas e financeiras para saldá-las.

Isso é uma questão tormentosa e compreende até o aspecto de piedade que os fiéis cristãos devem respeitar.

Enfim, o honesto, o verdadeiro mesmo é fazer apenas promessa que você, por ato ou tarefa sua, com a honradez do seu suor, efetivamente possa pagar.

Façamos sim a solidariedade, por ato nosso e com a finalidade moral e ética necessária para que tenha legitimidade e a verdadeira dignidade humana.

Fazer solidariedade com a moeda alheia, nada mais é que enaltecer a nossa pequenez e a necessidade irracional de autopromoção.

André Luís Luengo: Delegado de Polícia. Doutor em Direito Constitucional. Professor da Academia de Polícia e de Faculdades do Ensino Superior. Contato: luengo.garra@hotmail.com