Medida que altera a LDB, permitindo que universidades privadas também possam revalidar diploma de graduação concedidos no exterior, foi incluída no programa ‘Future-se’; MEC diz que, no Novo Revalida, a revalidação de diplomas de medicina será de ‘competência exclusiva’ das universidades públicas.
A Associação Médica Brasileira (AMB) disse que vai recorrer à Justiça contra uma das propostas do Ministério da Educação sobre a flexibilização da revalidação de diplomas emitidos no exterior por faculdades e universidades privadas brasileiras e a falta de garantias de continuação do Revalida, o exame obrigatório para a revalidação de diplomas de medicina obtidos fora do Brasil.
Em nota divulgada nesta sexta-feira (19), a AMB diz que, no caso de estender a permissão para revalidação à rede privada de ensino superior, “quem lucra são apenas os donos de faculdades particulares”. A entidade afirmou ainda que “nem o próprio MEC conseguiu justificar tecnicamente a necessidade e os benefícios desse movimento”.
A medida, segundo a AMB, foi apresentada nesta semana ao Grupo de Trabalho que estuda mudanças no Revalida, em crise desde 2017, quando um aumento da demanda levou a 1.337 ações judiciais e a um atraso de mais de um ano.
Entenda a crise do Revalida:
A edição de 2017 só terminou oficialmente em junho deste ano, com o resultado final, após recursos, divulgado para os últimos candidatos que faltavam: um grupo de 46 médicos formados no exterior que precisaram refazer a segunda fase da prova, por causa de uma falha técnica na primeira aplicação.
No fim, apenas 5,27% dos médicos participantes conseguiram a autorização para revalidar o diploma e poder exercer a profissão no Brasil.
MEC diz que revalidação segue nas universidades públicas
Na nota, a AMB defendeu que o exame continue sendo aplicado uma vez por ano e afirmou que “o ministério disse que pretende incluir na portaria interministerial sobre o tema a permissão para que faculdades particulares se responsabilizem por parte do processo, o que vai criar um verdadeiro balcão de negócios, a exemplo do ocorrido nos últimos governos”.
Procurado pelo G1, o MEC divulgou nota na qual “esclarece que o Novo Revalida não retira das universidades públicas a competência exclusiva na revalidação de diplomas de médicos formados no exterior”.
A associação disse ser “veementemente contra essa proposta”, e acrescentou que “o GT foi usado para conferir uma pretensa legitimidade para uma proposta que já estava montada pelo MEC” e que a garantia de que o Revalida continuará sendo pré-requisito no processo de revalidação, ponto que, segundo a entidade, era um consenso entre os participantes do grupo, “não está mais garantida”.
“O empenho do MEC em colocar no processo de revalidação de diplomas as universidades particulares, mesmo isso sendo ilegal e ferindo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação”, afirmou ainda a AMB.
‘Future-se’ altera a LDB
Uma das propostas do projeto de lei do programa “Future-se”, divulgado nesta sexta-feira (19) pelo Ministério da Educação, altera 17 leis em vigor, inclusive a LDB, que sofreria alterações em dois trechos, inclusive para flexibilizar a permissão de revalidação de “diplomas de graduação expedidos por universidades estrangeiras” a “institutos e universidades públicas ou privadas reconhecidas por portaria do Ministério da Educação como de alto desempenho”. Atualmente, apenas as universidades públicas podem fazer a revalidação (leia mais abaixo).
O MEC explicou ao G1 que a mudança da LDB proposta pelo “Future-se” só diz respeito aos demais cursos de graduação, e não abre brechas para que instituições privadas possam revalidar diplomas de medicinaemitidos no exterior, porque a regra específica para o Revalida, que centralizou o exame de revalidação no governo federal em 2011, tem precedência sobre a regra geral (nesse caso, a LDB).
Diálogos sobre as mudanças
O GT sobre o Revalida foi criado em maio e realizou pelo menos três reuniões presenciais entre os membros que incluíram diversas entidades da área de formação médica, segundo fontes ouvidas pelo G1.
Já sobre o “Future-se”, o secretário de Educação Superior (Sesu), Arnaldo Barbosa de Lima Junior, rebateu críticas de falta de diálogo antes do lançamento do programa.
Em entrevista no início da tarde desta sexta ao G1, Lima Junior afirmou que, desde que assumiu o cargo, no início de abril, se reuniu com diversos especialistas e reitores das universidades federais sobre suas propostas de melhorias para o ensino superior.
“Até a UNE teve assento preferencial”, afirmou ele, referindo-se ao convite à União Nacional dos Estudantes para participar do evento de lançamento do “Future-se”.
Ele ressaltou, ainda, que a minuta de lei ainda não representa o texto final que o MEC encaminhará ao Congresso Nacional, já que a proposta ainda está aberta à consulta pública.
A consulta foi aberta às 10h de quarta-feira (17), logo após o lançamento do programa. Até as 15h30 desta sexta, mais de 9 mil pessoas haviam feito cadastro no sistema para acessar a íntegra da proposta. Dessas, mais de 5 mil pessoas já enviaram pelo menos um comentário, segundo um balanço enviado pelo MEC ao G1.
Mudanças na LDB
Para tirar o “Future-se” do papel, o MEC sugeriu mudar 17 leis atualmente em vigor. Segundo Lima, o objetivo dessas mudanças é principalmente oferecer segurança jurídica às universidades. Ele ressaltou que o novo modelo proposto pelo programa não é um modelo jurídico, e que as universidades seguirão sendo autarquias (entidades da administração pública indireta, com autonomia para sua execução financeira).
Uma das leis que, segundo o documento, seria alterada, é a Lei de Diretrizes e Bases (LDB).
As críticas da AMB estão direcionadas ao trecho que altera o parágrafo 2º do artigo 48 da LDB. Veja a comparação:
- Como é hoje: “§ 2º Os diplomas de graduação expedidos por universidades estrangeiras serão revalidados por universidades públicas que tenham curso do mesmo nível e área ou equivalente, respeitando-se os acordos internacionais de reciprocidade ou equiparação.”
- Como ficaria com o “Future-se”: “§ 2º Os diplomas de graduação expedidos por universidades estrangeiras serão revalidados por institutos e universidades públicas ou privadas reconhecidas por portaria do Ministério da Educação como de alto desempenho, que tenham curso do mesmo nível e área ou equivalente, respeitando-se os acordos internacionais de reciprocidade ou equiparação.”
O MEC ainda não divulgou que critérios usaria para considerar uma instituições “de alto desempenho”.
Além disso, o dispositivo divulgado nesta sexta cria um novo parágrafo:
- “§ 4º Serão automaticamente revalidados e reconhecidos os diplomas de graduação e pós-graduação expedidos por universidades estrangeiras de alto desempenho, reconhecidas internacionalmente, nos termos do regulamento.”
O regulamento ainda não foi divulgado pelo MEC.
Fonte: G1