A Pandemia e os Encarcerados

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A PANDEMIA E OS ENCARCERADOS

Em nossa sociedade, onde há uma divisão imensa de “castas”, temos, para nossa vergonha, uma classe que é torturada diuturnamente, pior do que se estivéssemos na Idade Média. São os presidiários que os donos do poder e a sociedade que os apoia, deixam viver de modo ignóbil, trancafiados sem a menor consideração da população.
Outro dia, conversando com um amigo médico, ele me contava que tratou de presidiários que lhe contaram como viviam em uma cela da prisão. A cela era para 6 pessoas. Havia 6 camas-beliches de concreto. Porém, além das 6 pessoas que dormiam nas camas havia outro tanto se apertando no chão para dormir e, por incrível que pareça, ainda sobravam alguns que nem no chão podiam dormir por falta de espaço. Assim, eles tinham que dormir em pé, agarrados aos beliches para não cair. Nem animais são tratados com tamanha crueldade. Isso em tempos normais. Imagine em épocas de pandemias.
A mídia comentou que os familiares dos presos foram impedidos de entregar produtos de higiene e alimentação para os detentos porque os agentes temiam que essas coisas pudessem trazer consigo o vírus da covid19. Acontece que o Estado, guardião e responsável pela integridade dos  presidiários não provê, como deveria, os alimentos e os produtos de higiene para os presos.
O que o Estado faz com os detentos é um crime bem maior daquele que eles podem ter cometido. A prisão tem como escopo retirar o indivíduo da sociedade, recuperá-lo para devolvê-lo em condições de conviver com seus iguais. Em nenhum momento a lei permite as condições desumanas em que são jogados esses indivíduos. Que tipo de comportamento se pode esperar de quem é submetido a tais tratamentos?
Nossas leis não atentam para essa realidade até porque na sua imensa maioria são pobres e pretos os “hóspedes” das prisões. “Quem vive entre feras, sente necessidade de também ser fera”, já dizia o poeta. As leis tem como escopo isolar o indivíduo da sociedade, recuperá-lo e prepará-lo para retornar à sociedade e viver normalmente. Porém, com um tratamento como muitos recebem, acabamos por criar indivíduos revoltados, regurgitando em toda oportunidade o ódio a uma sociedade que o martirizou, tratando-o pior do que se tratam os animais. Só para se ter uma pálida ideia das condições nas penitenciárias: em Dracena tem 700 vagas onde se amontoam cerca de 1700 presos.
Agora temos essa pandemia do coronavirus. Imagine o que será isso na população carcerária! Como ficam as exigências de isolamento, de evitar qualquer contato entre essas pessoas e também com os funcionários que convivem com eles! Se a pandemia for como tem sido apregoado, não restará nenhum preso sem ser infectado.
O Brasil, vergonhosamente, apresenta a segunda maior população carcerária do mundo. Há uma porcentagem enorme de encarcerados ainda sem julgamento. Estão a espera de que as digníssimas autoridades consigam algum tempo para julgar os crimes a eles imputados. Fizeram bem, alguns juízes, em mandar para prisão domiciliar aqueles que foram detidos por crimes de menor gravidade, o que deveria ser seguido por todos os outros magistrados.
Enquanto isso não acontece, essa enorme massa humana fica ali abandonada à própria sorte, mesmo em tempo de pandemia como a que começamos a enfrentar.
Thereza Pitta
até segunda-feira